segunda-feira, agosto 28, 2006

Com sorte, talvez ninguém o reconhecesse, ou, pelo menos, não alguém que fizesse caso com o contexto da foto. Mas era, definitivamente, um aviso, um último recado que pedia com urgência uma atitude. Mesmo a legenda estava cheia da perspicaz ironia de Flávia, dizendo tudo, quase sem dizer. Mas como, diabos, ela conseguira aquela foto? Olhou o retrovisor, sentindo-se vigiado e, depois, desprotegido, apesar de que, aparentemente, a rua estivesse deserta.

Israel não deixou de perceber a aflição calada do pai. De um certo modo, isso lhe acalmou um pouco. Afinal, não eram simples bobagens de criança aqueles sentimentos que lhe tomavam. Seu pai parecia ter mil segredos dentro de si, quem sabe colecionados ao longo da vida toda. Que ele, Israel, faria com os seus? O céu, as estrelas, a lua, todos confidentes que lhe entendiam como se parte dele fossem. Restava-lhe ainda uma vontade de que, não só que o ouvissem, respondessem às suas indagações ou ao menos compartilhassem seus mistérios de forma menos silenciosa.

A irmãzinha puxou seu cabelo, já estava virando costume. Antes que Israel revidasse de alguma forma, porque criança nunca deixa barato, a mãe interveio, falando firme com a caçula. A pequena Samira queria atenção, e a cabeça de Israel era a única ao seu alcance. Talvez mais alguns poucos anos e já pudessem conversar sobre isto de caminhar com as próprias pernas.

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