sexta-feira, setembro 29, 2006

Pesquisa, só informal

Uma coisa que entendo mais atrapalhar que colaborar são as pesquisas de intenções de voto. Simplesmente porque as pessoas são ou tentadas a votar em quem teoricamente a maioria votará ou naquele que tem virtuais chances de disputar o segundo turno com este candidato. Isso fez com que uma colega minha dissesse que não vai votar no Cristovam Buarque porque ele "tem apenas 2%". Sou a favor de que se proíba a publicação de pesquisas de intenção de voto. Alguma medida tem que concorrer contra a ignorância do eleitor.

E já que estamos no tema, este é o resultado parcial da Primeira Pesquisa Diversa e Avessa:

Lula - 0%. Sem chance; quiçá no eventual segundo-turno; quiçá.
Heloísa Helena - 0%. Era a segunda opção, quase fui com ela.
Cristovam Buarque - 100%.
Geraldo Alckimin - 0%.

Entrevistados: um.

Desregras

Alguém acredita na extinção completa da corrupção? No desaparecimento de modos ilícitos de cooptação de votos? No fim dos discursos retóricos e demagogos? Talvez um otimista, diriam - eu digo mal informado. É irracional ou utópico pensarmos num processo democrático livre de todos os ruídos e desvios a que está submetido. Mas certamente algumas regras podem ser implantadas para tornar o voto individual representação de interesses cada vez menos suscetíveis a tendências externas operando por conveniência. Está claro que, na medida em que o eleitor precisa de alguma forma tomar conhecimento sobre os concorrentes, a informação que até ele chegar inevitavelmente passará por meios distantes da imparcialidade. Aliás, ainda crê alguém neste mito?

Parece menos pior, ou mais justo, deixar à sorte o egoísmo inerente às pessoas do que o egoísmo criado em laboratório e disseminado de maneiras silenciosas a berrantes. É verdade que alguns mecanismos já existem nesse sentido - temos o voto confidencial, pra citar o exemplo mais sedimentado, temos o boca-de-urna proibido, para citar o que é sempre notícia nos jornais. Mas quantas alterações seriam bem-vindas! Quantas são urgentes! O aperfeiçoamento do jogo eleitoral é medida não tratada nos nossos plenários. Não à toa, temos visto não outra coisa senão o abuso do poder, a impunidade, o apadrinhamento, a infidelidade partidária e o descaramento dos políticos.

Os eleitores viram peças fáceis em um jogo de regras insuficientes. A esfera política afasta-se da sociedade enquanto dá a falsa aparência de que tem o povo o poder de julgar os fatos que a perfazem. Falsa aparência! São tão somente os ditos representantes do próprio jogo político que fazem seu julgamento - o problema é que são, naturalmente, muito tolerantes consigo mesmos. Óbvio que, com esse sistema desregrado, tudo caminha para massa, molho de tomate, queijo, orégano e outros ingredientes menos comestíveis.

quinta-feira, setembro 28, 2006

Preso Espelho

Testo com toques teu tom
Tento teu beijo forçando teus olhos a me namorar
Encanto um motivo, um motivo de rima.

Caio no espelho, fico preso
Tonto teus olhos me chamam para nadar
Olhando-me sorriso, sonhado.

Não, não conheço o caminho
Ali me fico, ali me farto
Tanto teso quanto gozo
Tanto gozo como gozas.

Prende, passas e retinas
Torto, trago à tona um suspiro
Sustentando notas sem rosto
Eu, tinta mancha no teu quarto.

Minicontos

Dia Noite

Escureceu a manhã, da nuvem de tempestade. Tudo escuro, feio, que medo. Com poucas palavras, meu amor, soprou tudo para longe, fez-se novamente o dia.

Dando Atenção

Noite tarde, estrada pela frente. O caminho ficou curto com tua atenção. Baixo a guarda e quase que o carro desgoverna estrada afora.

De Dedo em Riste

Desempregado e desgraçado na cidadezinha, não tinha mais nada a perder. E não teve dúvidas, olhou para o homem e disse:- Ôoo sêo prefeito, o senhô vá tomar bem no meio do seu cú!

Escapou

Era muito cedo para pedir desculpas. Ainda podia defender-se que nem homem, mentindo.

quarta-feira, setembro 27, 2006

Noutro 27 de 9

Descobri porque escrevo. Acabei de ler, ali nas paredes textuais da Fabico: o papel aceita tudo. Não é uma justificativa admirável. Mas é a que parece mais plausível agora. Em terreno onde me é difícil a expressão - e o julgamento faz parte do jogo - me calo, silencio. As palavras escritas me livram do silêncio absoluto. Talvez eu mesmo seja meu juiz mais severo: decretei prisão a uma vida paralela, enclausurada em linhas. Linhas de escape. Pareço fora de lugar: meu crime, minha sentença e minha fuga ocupam o mesmo espaço. Por algum motivo inventei um mundo sem porta de saída. Talvez nem seja mais metáfora eu procurar aqui uma saída de emergência. Vejo claramente a escuridão de meu dilema - não será tarefa fácil. De cara já me deparo com a vergonha de publicar o que soa estranhamente como auto-traição. Mas por que publicar? Para que os outros devem conhecer meu desespero em voltar à superfície? Maneira vaidosa essa de pedir ajuda, como se só o fizesse para bem representar o papel de vítima:

Culpado. Por algum motivo, culpado. Bem sei eu que esta pena em minhas mãos é que escreverá a seqüência dessa história. estive mostrando minha face sombria, como um planeta dentro da noite. sabotagem foi a grande cratera que cavei no solo pedregoso. Engulo esse amargo vazio enquanto teço meu plano de busca. se o construísse organizadamente deveria começar por uma investigação. Minha doçura parece estar transparentemente diluída. Todavia ainda a sinto. Naufraguei-me e tenho que procurar o colete em noite de lua nova.

terça-feira, setembro 26, 2006

Singela homenagem de um admirador

o nome secreta a virtude
(predicado nominal)
diria até que secreta a verdade
não fosse o internacional

sujeito luis
substantivo de um camões
da flor última do Lácio
pétalas de faz-me-rir

verbo fernando
(mas bem intencionado)
humor sutil soprando
de um sax afinado

não qualquer adjetivo:
é de respeito
o predicativo
do sujeito

posto merecido
(issimo de elevado)
Verissimo,
Verissimo, abençoado!

*completa setenta anos hoje.

Mário Quintana

"E nunca me perguntes o assunto de um poema: um poema sempre fala de outra coisa."
"Quando alguém pergunta a um autor o que este quis dizer, é porque um dos dois é burro."

segunda-feira, setembro 25, 2006

Tardinha de primavera

Marcelo chegou cansado e tomou seu banho bem demorado, coisa que ele vinha pensando durante todo o trajeto do ônibus. Não pôde ler seu livro hoje, não conseguira assento. Tudo bem, afinal, não é sempre que consegue dar férias prá cabeça. Ligou a água para o chimas e foi cortar as unhas. Escolheu uma revista que pensa que não vai querer ler tão cedo para aparar as aparas, e abriu em uma página que chamava atenção, para distraí-lo enquanto fazia sua manicure. Quando terminava a primeira unha da segunda mão (sempre começava pela mão esquerda e ia do polegar ao mínimo de cada mão) tocou a campainha. Estranhou já que não esperava ninguém, mas também não deu ao assunto grandes importâncias. Ao olhar pelo olho mágico as pernas ficaram bambas e o terror tomou conta dele por inteiro: como ficara sabendo de seu paradeiro?

sexta-feira, setembro 22, 2006

Num Baile

Enquanto isto, no baile das palavras, o salão estava animado. Coisa bonita de se ver. Junção animada, formando cada frase que dava gosto. Tinha de tudo, verbos intransitivos, substantivos, nomes próprios, adjetivos que qualificavam o lugar. Daí, se pode imaginar a poesia que se formava naquele ambiente.
Pois foi quando chegou um palavrão com seu bando. Palavras de baixo calão, sem dúvidas. Coisa triste, colocaram um ponto final em tudo.

Ainda da série de links...

Do Millôr.

Dança das Palavras

Machado, olhou para o relógio e achou que já era hora de parar. Bloqueou seu computador, verificou sua carteira, organizou os papéis que lhe auxiliavam em sua tarefa, levantou-se de sua cadeira, dirigiu-se até a porta, abriu-a e saiu da sala. Ao passar pelo corredor que o levaria à escada, sempre usava a escada, cumprimentou os colegas com um até mais geral. Abriu metade da porta que levava às escadas, passou meio corpo, e voltou. Um gole d'água não iria mal naquele instante. Estava gelada. Voltou à porta, agora completamente.
Dali começava. Aos poucos, ainda alerta com a possibilidade de encontrar algum conhecido interessado em assuntar. Elas vêm, uma por uma, primeiro baixinho, soltas. Ao ganhar a rua, o sol bonito e morno, presente numa manhã de inverno, atiça as idéias, que não fazem mais cerimônia. Uma segue à outra, atropelam-se e gritam. As mais felizes riem, querem compartilhar. Outras, mais pesadas, mais sérias e sizudas, sentam-se num canto, solitárias, mas sua presença soturna marca, é constante, um bumbo, um baixo.
Descendo em direção ao centro, Guaíba à vista, rostos estranhos na contramão, os pares começam a se formar. Engraçado, pensamentos lógicos e objetivos, observações do entorno continuam, mas o abstrato não cede, pelo contrário, frases mais voluntariosas, já formadas, tomam a frente e fazem-se notar, indo e vindo, indo e vindo, vindo e ficando e tomando conta, marcando seu espaço. Porto, portas, uma amor distante ou a lembrança fresca, não importa. Machado olha seu relógio, ainda tem uma hora, e daí? A passo, volta para o prédio, para sua baia. Sabe que só tem um jeito deles pararem, e é prendendo os mais salientes para servirem de exemplo aos demais. Seu computador já está cheio deles e ele se sente aliviado.
Amanhã tem mais.

quinta-feira, setembro 21, 2006

Socialismo

... um fator significante no apoio popular ao socialismo através dos séculos tem sido a fé de que a mudança de uma atividade do escopo da escolha privada para o da escolha pública envolve a substituição do motivo do ganho privado pelo do bem comum.
James Buchanan e Gordon Tullock - The Calculus of Consent (1962, p. 19)

segunda-feira, setembro 18, 2006

Guimarães Rosa - Sagarana - Minha Gente

-Queria perguntar uma coisa...
-Pergunte, Maria irma.
-Não. Não sou curiosa.
-Então, eu sei o que é...
-Então?
-É a respeito... Bem, é sobre... Você quer saber se eu deixei algum amor, a esperar por mim?
-Se deixou, ou não, não me interessa...
-Então, por que você quis perguntar, prima?
-E por que foi que você adivinhou a pergunta, primo?

***
Não
Me conta como foi
Não
Quero saber se sim
Não
Quero saber se
Não

Se não
pensas que vai ser igual
Não
se güentas em guardar só prá ti


senão é melhor do que
sim
é melhor do que
não

Não
Faz a conta do que tá prá vir
Não
Alimenta o monstro em mim
Não
Aproveita que eu me perdi

Sim
Tô muito por ti
Se não
faço muito por nós

Por fim
Só me resta entender
Que não
Disseste que sim
talvez
melhor esquecer

sábado, setembro 16, 2006

Maré subiu

A maré volta sim
Perdi o medo e deixei me levar
Prá onde, diabos?
Prum samba?

Pro fundo.
Não tem questão,
pode sair, pode ficar
eu vou até aí.

Num fim, final
num pouco, um canto
prá ela, um beijo
pro fim da rima.

Afogo, e dou risada.
Oceano em volta, tu
Ar não mais
Pulmão encharca de ti.

sexta-feira, setembro 15, 2006

La Omissión de la Familia Coleman

onde está você
onde vocês estão
sinto falta disso como era
mas agora é omissão

homens são de primavera
o resto é invenção
alguém quer passar frio
eu não

não sendo eu que me importa
se escalo nas tuas costas
e desfaço nossos laços

onde está você
onde vocês estão
sinto falta disso
como um dia ousara ser
mas não tem mais isso não

eu omisso
talvez seja até vício
mas aqui não tem irmão
fomos todos concebidos
não seremos redimidos
encontrando por que mão

eu que digo pronde vou
e se te quero comigo
e é quase um perigo
dividir contigo um pão

sou mais eu, sou mais meu
sai da minha pista
que eu sou mais egoísta

(mas a peça é um primor)

Quiçá sejamos peixes

de dentro ouço sua voz
a escorrer do céu
dos sonhos que se derramam pelo mundo
me busca num pedaço de papel
e me escreve de água

a tinta deste outro que não sou
escapa da verdade que me luz
e a transparência que me mar
me veste d'alma viva que ficou
e me cobre de água

eu corro, eu corro, eu corro pra buscar
e gota atrás de outra traz a força
que me corre desta apatia
que me morre nesta ilusão
e me impele àgua

ah chuva, me acha, vai
que eu corro pro tempo vir
aquele tempo de existir
que me molha de mim

ah chuva, me olha, vem
que eu tô pra achar o meu bem
e a vida há de secar
bem longe daqui

quinta-feira, setembro 14, 2006

Macaquinhos no sótão

Felipe Maciel diz:
Bubbles are cool

. : FêCris : . we've been living life inside a bubble diz:
yes!!!
. : FêCris : . we've been living life inside a bubble diz:
very very
. : FêCris : . we've been living life inside a bubble diz:
mas podem não ser também...as pessoas todas lá, te olhando...

Felipe Maciel diz:
A minha bolha é opaca

. : FêCris : . we've been living life inside a bubble diz:
haahaha mas daí tu vê o teu próprio reflexo dentro

Felipe Maciel diz:
Isto não é problema... o pior é que os pequenos macacos que vivem dentro da minha cabeça são paranóicos e odeiam bolhas

. : FêCris : . we've been living life inside a bubble diz:
bah.... acho que o problema daí não é eles odiarem e sim eles existirem!

Felipe Maciel diz:
Sim! E eles berram
Felipe Maciel diz:
Não é muito bom prá trabalhar...

. : FêCris : . we've been living life inside a bubble diz:
nem pra dormir, imagino...

Felipe Maciel diz:
Não tem problema. Temos horários parecidos...
Felipe Maciel diz:
Eu tive que me adaptar

quarta-feira, setembro 13, 2006

Love, don't go!

quase amargou
mas amar não vai, assim,
do nada, mais

vem o doce
traz bem aqui
na ponta pra mim

não engole
o amor não se toma de gole
amargou, deixa pra trás

quase esqueci
mas amar não é de se esquecer
(isso é pro resto)
o amor esquecido é indigesto

Breathe - Pink Floyd

Tom: Em

Intro:

Em A A4

C Bm F7M G D7(#9) D7(b9)

Em A A4 A
Breathe, breathe in the air
Em A A4 A
Don’t be afraid to care
Em A A4 A
Leave but don’t leave me
Em A A4 A
Look around and choose your own ground
C
For long you live and high you fly
Bm
And smiles you’ll give and tears you’ll cry
F7M
And all you touch and all you see
G D7(#9) D7(b9)
Is all your life will ever be


Em A A4 A
Run, run rabbit run
Em A A4 A
Dig that hole, forget the sun,
Em A A4 A
And when at last the work is done
Em A A4 A
Don’t sit down it’s time to start another one
C
For long you live and high you fly
Bm
But only if you ride the tide
F7M
And balanced on the biggest wave
G D7(#9) D7(b9) Em
You race toward an early grave

Mar do Silêncio



Nalma duns bate estrondo,
estrondo de mar.
É aguada caindo,
que parar não pode.

E divide por metades,
por seu lado cada uma vai.

Doutros pára,
fica na quietude.
É chuvisco sereno,
sem tempana amostra.

E divide por metades,
que vão sem anunciar.

Seguem
fluxos,
cada
qual
por
si.

E
quem sabe?
lá na frente,
tropicando,

bate mar, bate paz,
fica tudo misturado...

segunda-feira, setembro 11, 2006

Nem queiram saber

Enquanto isto, não muito longe dali, a consciência pesa. Desnorteado, me lembro fidedignamente de episódios que nunca existiram, mas que trazem o conforto de confortarem. Contar uma estória, tentar entrar para a história, nem que seja na de alguém com quem não preciso conversar.
Fumaça e fogo nos céus da serra, ou do vale. Ou me engano em escolher qual história quero fazer parte. Isso não se escolhe, se vive, mas sou teimoso o suficiente para querer escolher a minha. Subir ao topo é fácil, difícil é querer ficar lá. Bom, desisto.
É... parece que é
Mas, se aconteceu,
fazer o quê?

Melhor falar,
e depois,
deixar acontecer.

Mesmo porque
engolir é pior
deixar mal resolvido...

Teorias existem
para serem refutadas
por novas evidências
Que nem imaginávamos

Doido, doído
medo sem lugar
Porque é bom
Porque não sabe onde colocar.

Assusta sim,
também não sei
Só sei que está
dentro de mim.
Ah, se a Lady Mercado cuidasse de perto seus filhos! Mas ela está sempre ocupada com essa vida de negócios. A Oferta, por exemplo, não anda comendo direito, talvez esteja com anemia até. A Demanda, (nem parecem irmãs gêmeas!), beira a obesidade. Deve comer do prato da outra. Ah, se a Lady Mercado não deixasse tudo por conta da babá ou dos avós. A babá tem a didática de um Pinochet; os avós, partidários do laissez-faire. Em que confusão crescem essas crianças! E a Lady Mercado não sabe a metade. Quando escapa da correria vai pro salão de beleza. Pra desestressar.

das vidas

a vida é um resquício de morte, um resquício de chão
é um caminho pro norte
e um pouquinho de me dá a mão

é quase desprovida de sorte
e comumente invadida por paixão

a vida voa, até se pilota
pede que numa língua sejas poliglota

a vida é brisa, avisa até
pede numa boa não sejas um qualquer

a vida é um resquício de morte, um resquício de não
uma força que não chega a ser forte
que não chega a ter sempre razão

a vida passa, até devagar
estremece quando acorda de um cochilo
e depois corre como pra recuperar

a vida é por isso desordem
é até furacão
a vida é daqueles mordem
para além da refeição

é para além
(como disse frederico)
do bem e do mal
é lugar paradisíaco
e ao mesmo tempo infernal

a vida é o homem só
e o que há de Deus em si
o resquício, o pó
e o vestígio de uma alma
que, calma, sorri

das mortes

se eu fosse ter que fazer
tudo antes de morrer
que vida eu teria?
só de fato seria...
sério, é de morrer
é de correr pro cemitério
uma vida feita assim
sem mistério

se eu fosse ter que dizer
tudo depois de aprender
a falar
eu teria meia vida a haver
meia a reclamar
partir da morte do nascer
como a sombra d'arte
que sustenta o viver

se eu fosse ter
na vida
tudo que houvesse pra ter
teria devida a vida não ida
a vida de graça, a de ser
a de não ser suicida
a saber

domingo, setembro 10, 2006

Apressando
o passo,
mas ainda buscando a direção correta.

Previsto apenas
uma risada que fica quieta,
por dentro,
não externa.

Senta com calma,
seguro,
mas só na casca,
e começa de novo.

Volta um pouquinho,
prá não se perder.
Quero resolver logo,
prá logo começar.

Num momento desses,
fica até chato duvidar.
Antes disso, duvidam de mim,
mas mostro logo as garras.

Num bestiário de idéias,
todas tímidas,
vindo em pequenas doses,
sendo soltas quando ninguém presta atenção,
volto aos poucos prá retomar a rotina.

Incerto
é
que nem sempre vem na hora
certa.

Não
é quando eu quero,
mas
é quando eu posso.

sexta-feira, setembro 08, 2006

Noutras sextas-feiras



O cortador

A demissão em massa, naturalmente, produzirá uma grande oferta de trabalho. Mas o que parece não estar incluso nas fórmulas econômicas é o que o "capital humano" está disposto a realizar para entrar novamente em circulação. Le Couperet, filme de Costa-Gavras, mostra uma forma bem simples encontrada por Bruno Davert (José Garcia) para reingressar no mercado de trabalho: matar, um por um, seus concorrentes diretos. A imagem vira suspense tanto pelo modo como a história é contada pelo diretor, como pela proximidade com a realidade, que provoca uma aflição crescente, uma angústia ao presenciar um jogo que se joga sozinho e com regras desvinculadas de qualquer sentido de bem coletivo. O capitalismo corta, às vezes de maneiras silenciosas, as mais legítimas relações entre os homens. E ficamos pensando até que ponto elas eram legítimas.

*Le Couperet, "o cortador", foi traduzido aqui para O Corte.

quarta-feira, setembro 06, 2006

falar falar falar
pra se encher de razão?
vôo aflito
sobre a proximidade
é de ar ou é de vidro
essa transparência?
e esse vento contra,
cortar ou sustentar?

planos planam
tangenciam-se, curvam
e no sobrevôo
sou ponto, sou reta?

e se caio
abaixo do eixo
deixo de voar
sobre
passo à constância
da instância
de deixar
de ser

terça-feira, setembro 05, 2006

Por que escrever se eu posso cantar?

A Economia da Mentira

O fato de que mentiras são propagadas afeta o comportamento dos consumidores de informação. Isto significa que é mais difícil melhorar a exatidão de seus julgamentos quando algumas das informações por eles examinadas podem estar sendo desenhadas para enganar. Essencialmente, isto significa que o custo marginal de uma unidade extra de capacidade de julgamento é maior agora. Se a existência de mentiras no conjunto informacional disponível levará a mais ou menos tempo alocado em "pesquisa" sobre o assunto em questão, depende da elasticidade da demanda do consumidor por capacidade de julgamento.
Entretanto, a maior parte dos consumidores de informação não está engajada em um processo racional de tentar elevar a acurácia de sua decisão. Eles estão simplesmente pegando a informação porque eles obtém satisfação com isto. Se a informação inventada satisfizer mais o seus gostos do que a verdade, eles sentir-se-ão motivados a aumentar o seu consumo. Como é mais fácil inventar mentiras para satisfazer o gosto do público do que achar verdades que o façam, a introdução na mídia de histórias "interessantes" mas inverídicas sobre política pode aumentar as vendas.
Gordon Tullock (1967). The Economics of Lying, p. 143.

segunda-feira, setembro 04, 2006

Mesmo sem nada planejado, as coisas não corriam como o previsto. Ainda assim, a boa vontade, fruto talvez da lembrança de outros carnavais, imperava sobre as adversidades impostas pela natureza e pelo egoísmo. Risadas e álcool são capazes de tornar tudo mais leve e a tragédia iminente intimida-se pelo pouco caso com que é recebida.
Na troca de cenário, um frio e uma idéia, que leva embora os maus agouros, e deixa uma sensação de consumado. Tudo escuro, barulho, fumaça. No topo, uma armadilha traiçoeira, esperando por novas vítimas, ou por alguém que a use como trunfo. No meio do barulho, silêncio, tudo para para que se encontrem o menino dos olhos brilhantes e a menina do sorriso bonito. No instante seguinte, volta o barulho, volta a fumaça, voltam os movimentos. Não se conheciam, mas estavam lá para se encontrarem.
Tanta coisa prá falar que é melhor eu ficar quieto.

sexta-feira, setembro 01, 2006

Um dia em preto e branco pode ser pesado, triste. Mas é charmoso.

Afogando-me em uma nuvem, sem saber para que lado seguir, pode ser bem penoso equilibrar-se aqui. O vapor d'água é tão denso, mas não como as nuvens que vejo lá de baixo. Não é macio, branco e aconchegante. Como frio e úmido são correlacionados, tudo branco e molhado. A respiração volta, mas só quando eu quero, e, se não quero, me bate uma angústia sem controle, me debato até que meus pulmões não me obedecem mais e respiram sem minha permissão. Que engraçado! Converso com um cachorro na falta de companhia, mas ele não é capaz de me escutar. Ocupado, com certeza. O som do silêncio está por todos os lados, tentando resistir ao barulho de meus sapatos. Urinar é preciso, ainda que em qualquer lugar vago. Não me cabe julgar os desejos do meu corpo, mas pela quantidade, eu já devia ter tomado esta providência faz tempo, mas não consigo prestar atenção em tudo ao mesmo tempo. Passo em passo, os passos se suscedem e suscedem-se os passos, um de cada vez, o direito e o esquerdo, um após o outro após o um após o outro após o um, sucessivamente. Tantas vezes se sucedem que chego à porta. Uma chave prá uma fechadura, uma única combinação de ranhuras no metal que permite o acesso a quem a possuir. Uma única, e esse é o problema, são tantas e tão parecidas, e se multiplicam e trocam de lugar. A muito custo, o silêncio já é passado que os passos ganham companhia no outro extremo que não vejo pois a nuvem insiste. E de novo outras chaves e de novo outras chaves. O enjôo gira tudo não dá prá fechar o barulho não rápido gira e que nojo abraçado mais água não faz barulho e girando.