terça-feira, outubro 23, 2007

A ponte

É uma ponte que se impõe sobre uma avenida larga de Santiago del Chile. Ou sobre um desses arroios de água escassa e meio suja, não lembro precisamente o que se passava embaixo dela. Voltávamos para o albergue com o suprimento recorrente naqueles dias: pães, alface, frios, refrigerante. Nas extremidades da ponte - que pode muito bem ser um viaduto mesmo, mas um lindo viaduto - sinais de anarquistas junto às escadas. Escadas que subíamos em duas voltas. Lá em cima, sobre a ponte, era sol. Um caminho de sol, de céu chileno sempre azul, da grande montanha ao fundo. Nunca vou esquecer daquela montanha ao fundo. Ela dizia: Santiago; esta é Santiago. Eu parava pra ouvir, era doce. Desde a base da fabulosa cordilheira, fazia um trajeto com a cabeça em direção ao céu. Ali encontrei o espírito da cidade. Pertencia a ela, que cochichava seu nome em meu ouvido. Um sopro de vento fresco dava uma sensação de liberdade. Pode parecer paradoxal, ela me pertencia, e eu era livre. Mas era assim. Aquela montanha não me cercava, o céu tampouco me suprimia. Diziam: tu pertences ao mundo, podes ser altíssima montanha, podes ser infinito céu, podes ser simplesmente o que caminha e sabe. - Prazer. Um compromisso bom: responsabilidade pode muito bem ser isso. Liberdade tem limites de firmamento, fronteiras feitas de montanhas respeitáveis. A responsabilidade por minha vida. Ganhei assim, de graça.

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