sexta-feira, janeiro 26, 2007

Sábado

Baixa a persiana e deita encolhido, como se estivesse com frio, e espera passar. Não passa. Mudança de planos. Veste uma camiseta já tirada e calça-se. As chaves. Volta ao quarto, revira a escrivaninha. Lembra-se do bolso da mochila, não precisou delas da última vez que entrou. Da porta recém aberta, passa o ar frio, encerrado do corredor que carece de ligação com a rua, ar de caverna. Do quente para o frio para o quente. Já fora, o mormaço de verão castiga, absorvendo o ânimo já escasso da tarde de janeiro. Árvores às vezes ajudam, ver verde acalma.

Num sonho estranho, como é a maioria, viu um professor, com o qual teve pouco contato, vestido de palhaço. Não é engraçado, é antes um palhaço triste. Palhaços são tristes, tristes ou malignos, não importa. Era só figurante. Importaram mais as escadarias intermináveis, que subiam e desciam, não lineares. Nunca se sabia ao certo onde tal caminho iria dar. E na pequena praça, debaixo de chuva, todo o tipo de tipos ameaçadores. A fotografia era escura, atmosfera abafada. Um quê de filme noir, mas em um clima de distopia. Tudo às avessas, pessoas estranhas, nenhum olhar cúmplice, a falta de uma referência, do porquê de tudo estar daquela maneira.

Nem cogita o ônibus e segue a pé. As ruas vazias denunciam o fim-de-semana e aumentam ainda mais a angústia. Homens num bar, uma dupla com uma cerveja, outro de pé no balcão bebericando qualquer coisa misturada com fanta, todos matando tempo. Pena ou inveja? Talvez ambos. Pela Redenção, aproveita a volta das sombras mas não gosta de ver pessoas felizes. Enfim, só corta caminho por entre bicicletas e chimarreiros. Pela André da Rocha, sobe a Marechal. Olha para os lados e entra na porta escura. O mesmo ar cavernoso, como se os corredores escuros fossem ligados por alguma galeria secreta e comum. Sobe os quatro lances de escada num só fôlego e para para respirar enquanto olha para a porta descascada no fundo do corredor. Bate na campainha, o olho mágico escurece, a porta se abre e Isadora convida para entrar.

Um comentário:

Arbº disse...

vai que é tua